Opinião

PERDA: Quando a Morte é um ciclo de transformação

Morrer! Perder!

São dois acontecimentos que envolvem uma complexa teia de emoções, originando grandes transformações no Ser Humano e muitas vezes irreversíveis.
A perda de um objeto ou uma pessoa faz com que o Ser Humano entre numa espiral de sentimentos e emoções com cariz negativo, levando a uma trajetória de vida direcionada para o negativismo, tristeza e impotência. Há a perceção de que é o fim de tudo! Este sentimento de perda é muitas vezes associado ao ato de morrer, à perda de alguém, mas a perda pode estar também relacionada com um acontecimento vivido aquando uma separação (amorosa ou não) ou um afastamento caracterizado por uma componente física, temporal e espacial.
A morte surge como uma força suprema relacionada com a perda, uma vez que há uma ausência física associada à finitude do Ser e à eternidade. Assim, a morte, a perda de um objeto, de uma região corporal e/ou condição de vida são, portanto, factos associados ao Luto, um processo dinâmico e individual que engloba inúmeras reações físicas, emocionais, sociais, psicológicas e espirituais. É um processo dinâmico, dado que se desenrola ao longo do tempo e em várias fases. Cada uma delas vivida consoante a personalidade do indivíduo e sendo as mesmas mutáveis, porque não há uma ordem fixa que regule como estas devam ser vivenciadas.
Esta capacidade dinâmica do processo de Luto justifica, em alguns casos, o aparecimento de um estado não saudável – o indivíduo não é capaz de viver cada uma das fases, referidas anteriormente, no momento certo e com as ferramentas humanas necessárias. Existe contudo, e apesar da dificuldade de aceitação do termo, um Luto saudável – um processo que é vivido de uma forma muito pessoal, mas com um nível de compreensão e aceitação do facto, tornando-se assim uma oportunidade de transformação pessoal.
Podemos perguntar como pode ser um acontecimento doloroso, de tão grande complexidade humana, um fator de crescimento e de mudança para o Ser Humano, quando o mesmo vivencia emoções e sentimentos negativos e destrutivos ao longo de todo o processo… Respondendo à questão, é de facto uma oportunidade de transformação pessoal, quando o Indivíduo integra na sua essência a noção de apego e compreende o poder que o mesmo tem quando vivido nos seus dois limites extremos.
Viver agarrado ao apego, significa viver com uma sensação de posse pela forte ligação emotiva que o indivíduo cria com outra pessoa, com um objeto ou com uma condição de Vida. Quando apegado em demasia, o Indivíduo vive e sente como se aquela relação fosse a base da sustentação da sua existência e quando há um corte abrupto neste elo surge, então, uma complexa rede de emoções negativas, de incompreensão, vitimização e grande sofrimento.
A perda surge, deste modo, como um processo dinâmico e existencialista para o Indivíduo trabalhar o seu apego e acima de tudo o seu desapego, percebendo que as relações que cria, a vida que vive e os objetos que tem fazem parte da sua vida – na qual o ponto fulcral é o próprio Indivíduo!  Porém o medo de perder surge associado à excessiva proteção do que se tem, ficando-se escravo dessa relação – neste ponto, ainda não existe o entendimento, por parte do Indivíduo, de que se pode perder algo e alguém, mas nunca o sentimento que se vive por aquilo que se tem ou teve.
Podemos, neste sentido, dizer que o que faz alguém feliz não é aquilo que se tem, mas sim o que se sente com esse contacto. Quando o Ser Humano se aceita como o centro de toda a sua Vida e visiona cada fator externo como um prolongamento do seu ser, compreende que embora existam perdas, este continua a ser quem é, mantendo a sua capacidade de criar novas relações, adquirir novos objetos e lutar por novas condições de Vida.
A perda pode então funcionar como uma grande oportunidade de conhecimento para o Ser Humano, uma vez que lhe permite compreender a sua própria finitude e de tudo o que o rodeia, bem como entender que as emoções que sentiu aquando a perda podem ser transformadas em emoções de esperança e confiança, num processo de aceitação e renovação!
A transformação pessoal associada a uma perda pode potenciar assim um momento de revelação para o Ser Humano, pois neste processo ocorre uma compreensão e aceitação de que a perda é de facto um acontecimento negativo, mas que existe sempre a possibilidade de renovar a esperança e a fé no que a Vida nos reserva. Por outras palavras, a perda permite-nos perceber que apesar da finitude das pessoas e das relações há algo que permanece além de qualquer tempo ou espaço: os sentimentos vividos com e nesta relação, que podem ser guardadas dentro de nós.
Uma excelente ferramenta que pode ser utilizada em momentos de perda, como forma de potenciar este processo de transformação pessoal, compreensão e aceitação da mesma, é a escrita. Através da escrita podemos, por um lado, registar os nossos sentimentos e emoções vividas aquando a perda e, por outro lado, registar também os sentimentos e emoções que foram vividas durante as relações com as pessoas ou objetos que perdemos. Com este exercício de introspeção e aprofundamento emocional, somos confrontados com uma grande realidade: tudo o que sentimos nas várias vivências com as pessoas ou objetos foi muito gratificante e positivo e perpetuar-se-á toda a Vida. Serão esses sentimentos que nos direcionarão para uma aceitação plena da perda.
Aceitar uma perda, é aceitar uma oportunidade de transformação pessoal enquanto Seres Humanos!

 

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