DestaqueVideos

Vídeo: Ovos moles de Aveiro, os doces que não quebram a dieta, no Natal

Com o Natal a aproximar-se, há doçuras indispensáveis à mesa e há também quem se preocupe com quanto isso pode pesar no corpo. Mas temos boas notícias! Os ovos moles, por exemplo, assumidos como o ícone turístico e gastronómico da região de Aveiro, são muito menos calóricos que um pastel de nata, um queque, um croisssant ou uma bola de Berlim. O peso que os ovos moles têm na economia local e o protagonismo que assumem o ano inteiro, mas sobretudo no Natal, são o mote para conhecermos a única casa do distrito que mantém o tradicional fabrico dos ovos moles em forno a lenha.

Para abrir o apetite, comecemos pela surpresa… Comer ovos moles não engorda tanto quanto se possa pensar! Para quem julga que este doce conventual da região de Aveiro é uma bomba-calórica, desengane-se. De acordo com a Associação de Produtores de Ovos Moles de Aveiro – APOMA, um ovo mole de 20 gramas tem um valor energético de 72 quilocalorias, o equivalente a um iogurte, a um pão e meio, a quatro bolachas ou a meia barra de chocolate. Por outro lado, como não inclui na sua composição amido, corantes ou conservantes, é um produto mais natural e mais saudável que os que incluem estes aditivos.

Significa isto que ingerir um ovo mole de Aveiro pode até ser mais equilibrado do que adoçar o palato ou saciar a gula com alguns outros doces. Maria João Santos, gerente da Confeitaria Maria da Apresentação, lembra que “há pessoas que vão ao café e comem um pastel de nata todos os dias com o café”, não se dando conta de que “uma nata tem cerca de seiscentas calorias, ou um queque tem oitocentas e tal calorias, para já não falar das bolas de Berlim”. Em defesa dos ovos moles, esta produtora acrescenta que “é um produto recomendável porque, como tem um processo de cozedura muito lento, destrói a carga negativa que tem, destrói o colesterol negativo”. Graças a essa cozedura lenta, Maria João Santos assegura que “um ovo mole tem dez vezes menos colesterol que uma gema de um ovo cozido”. E garante, ainda, que “o processo de pasteurização, decorrente de o preparado dos ovos moles estar a ferver mais de dez minutos, a mais de cento e dez graus, também elimina o risco de eventuais salmonelas ou bactérias nos ovos, porque são destruídas”, sendo, por isso, os ovos moles “um produto muito seguro”.

De resto, esta empresária que trabalha com ovos moles há já 32 anos e que herdou o negócio de família, dá o seu próprio exemplo: todos os dias come, no mínimo, um ovo mole. “Para provar, para perceber alguma variação na qualidade da gema, quando são pessoas novas a fazer as massas, porque é preciso perceber se a massa está dentro dos nossos parâmetros, o que obriga a ir comendo”, explica. E não são só ovos moles que prova diariamente. Também come e prova “as raivas, os caramujos, outros produtos que fabricamos”.

Juntemos a tudo isto o facto de um estudo feito por investigadores da Universidade de Aveiro, publicado em 2012, confirmar que os ovos-moles podem ser congelados, sem perderem qualidades. De acordo com essa investigação, quando o doce típico aveirense é “ultracongelado a 40 graus negativos, mantém o sabor inicial e não é nocivo para a saúde, durante cerca de quatro meses”.

Receita secreta é mito

Feitos, apenas, com três ingredientes base – água, gemas cruas de ovo e açúcar de cana branco refinado – e envolvidos numa hóstia feita com farinha de trigo, água e gordura vegetal, a receita dos ovos moles não é, no entender de Maria João Santos, um segredo dos deuses. Admite esta gerente que “é mito dizer-se que a receita dos ovos moles é um segredo, porque o processo de fabrico dos ovos moles é exatamente como o de uma compota”. Só que, “em vez de juntarmos as frutas, juntamos as gemas dos ovos e o que diferencia é a qualidade da gema”.

A APOMA, entidade responsável pela certificação dos ovos moles, determina que a gema seja “obtida exclusivamente a partir de ovos muito frescos, de categoria A, classe L ou XL, com cor entre 12 e 13 da escala de Roche”. Maria João Santos confirma essa preocupação em “procurar sempre os melhores ovos, com uma determinada percentagem de gordura e com a cor que nos agrada”. No dizer desta especialista, “é a qualidade dos ovos que diferencia os ovos moles” dos cerca de quarenta produtores certificados da região de Aveiro, mas não só. “A maneira como são feitos também é muito diferenciadora”. Porque, “até dentro do mesmo estabelecimento comercial, o facto de ser feito pelas mãos de A ou de B varia, também varia o tempo que essa pessoa está com a massa ao lume, varia a forma como a massa é mexida e todos estes pequenos pormenores fazem a diferença”. Além disso, “o tacho também influencia o resultado final, dependendo se o tacho é de cobre, de inox ou de alumínio, porque cada metal tem as suas propriedades e cada casa que produz ovos moles usa o tacho que entende”. Por último e não menos importante, “o tipo de forno onde a massa é cozida diferencia muito o sabor”. Dependendo de a massa “ser cozida em forno a lenha, em forno a gás, no forno elétrico ou no forno de indução, o resultado final da massa é perceptível ao paladar”, assegura Maria João Santos.

A confeitaria Maria da Apresentação é a única da região de Aveiro onde “os ovos moles ainda são cozidos em forno a lenha durante mais ou menos, uma hora”. Como “o processo de cozedura é muito lento, influencia a textura da massa”, sendo a massa desta confeitaria “muito mais puxada, não é uma massa tão líquida como noutras casas”, explica a gerente. Além disso, neste estabelecimento ainda é “usado o tacho de cobre, mantendo o processo o mais artesanal possível e sendo fiel à receita original que foi passando de gerações em gerações”.

Fundada em 1882, a confeitaria Maria da Apresentação segue, ainda hoje, o processo de fabrico secular. Explica a herdeira do negócio que tudo começa com o partir dos ovos: “enquanto se partem os ovos, está ao lume o tacho com o açúcar e a água, a fazer o ponto de açúcar, quando o açúcar está no ponto, junta-se as gemas e coze-se a massa”. A massa “fica pasteurizada, porque vai a ferver a 110 graus, durante mais de dez minutos, e fica a arrefecer para o dia seguinte”. No dia seguinte, faz-se o “enchimento da massa na hóstia de farinha e água, depois faz-se a prensagem, unindo duas placas, recorta-se a hóstia e fica a repousar novamente para o outro dia”. Só depois disso “é passada uma calda de açúcar final e os ovos moles estão prontos para vender ao consumidor final”.

Ovos moles são mais vendidos no Natal

Algumas confeitarias optam por adicionar uma cobertura de açúcar aos ovos moles, que “não é obrigatória, mas ajuda a proteger a massa, dá-lhe um toque mais refinado e tapa qualquer imperfeição que haja na hóstia“. Outras fazem a cobertura dos ovos moles com chocolate, seguindo “uma tendência de reinventar este doce conventual, mas o verdadeiro apreciador de ovos moles prefere o doce original, sem cobertura de chocolate”, afiança Maria João Santos. Para os consumidores terem garantias da qualidade e da autenticidade do produto que estão a comprar, aconselha-se a opção por “produtores de ovos moles que tenham nos seus produtos a marca de certificação que é o selo de Identificação Geográfica Protegida, um símbolo comunitário que assegura que os ovos moles foram feitos por produtores dos concelhos de Aveiro e que são um produto de origem de confiança”.

Os produtores associados de Aveiro produzem, por ano, milhares de quilos de ovos moles. Apesar da insistência da Agência de Informação Norte junto da APOMA – Associação de Produtores de Ovos Moles de Aveiro – para a obtenção de dados atualizados, a informação pedida não foi facultada. Mas notícias publicadas, no início deste ano, nos meios de comunicação nacionais, indicavam que a venda de ovos moles bateu recordes de mais de quatrocentas toneladas, em 2022, o que representa cerca de dez milhões de euros de faturação. Sendo certo que este ícone turístico e gastronómico da região de Aveiro vende-se mais no Natal, também tem muita procura no Verão, “por causa dos turistas e dos aveirenses que vão para fora e levam ovos moles para o estrangeiro”, diz Maria João Santos. Acrescenta esta produtora que “o consumidor é muito seletivo” e que “há clientes que vêm buscar os ovos moles aqui à nossa casa, mas vão buscar o bolo rei a outra e vão buscar o pão de ló a uma terceira casa, porque gostam das características de cada estabelecimento para cada produto”. Entende, por isso, que a concorrência é saudável porque “é importante haver diversidade”.

Os ovos moles foram inventados no século XVI, no Convento de Jesus de Aveiro, pelas freiras que “ao usarem as claras dos ovos, ficavam com sobras de gemas”. Não havendo frigoríficos na época, “as freiras tiveram de inventar uma forma agradável de aproveitar as gemas, o que as levou a adicionar-lhes açúcar, que é um conservante natural, para não se estragarem, dando origem à receita dos ovos moles”, contextualiza Maria João Santos. Explica também esta produtora que, no passado, “os ovos moles foram usados como medicamento, porque a gema de ovo tem propriedades benéficas para os pulmões, as pessoas sofriam muito com doenças pulmonares, por causa da humidade, e esta receita era usada como medicamento para doenças pulmonares”. Tantos séculos depois, os ovos moles estão de boa saúde, recomendam-se e, ingeridos com moderação e por pessoas saudáveis, não apresentam contra-indicações.

Tags
Show More

Related Articles

Deixe um comentário

O seu endereço de email não será publicado. Campos obrigatórios marcados com *

Close