Cultura
18 Months – Ópera sobre (corpos) refugiados do Quarteto Contratempus apresenta-se em Famalicão antes de “embarcar” até Lisboa
A peça operática multimédia "18 Months", que será apresentada pelo Quarteto Contratempus na Casa das Artes de Vila Nova de Famalicão, nasceu como um tributo aos refugiados que enfrentam longas e difíceis viagens para escapar da guerra. A obra aborda a luta pela sobrevivência e a busca por melhores condições de vida. Criada pelo Quarteto Contratempus, em coprodução com a Casa das Artes e o Centro Cultural de Belém, será apresentada nos dias 21 e 22 de fevereiro e 10 de abril.
12 de fevereiro 2025

Antes de se converter num objeto artístico, num artefacto estruturado, a ideia de “18 Months”, a peça operática multimédia que agora está prestes a apresentar-se ao público na Casa das Artes de Vila Nova de Famalicão pela mão do Quarteto Contratempus, começou por ser, bem na sua génese, um tributo à jornada dos refugiados que fazem longas e tumultuosas jornadas de travessia marítima desde a sua terra natal até a um outro destino, como forma de escaparem à devastação dos respetivos territórios de origem causada pela guerra. Esta luta e demanda por maior segurança e melhores condições de vida faz-se sempre no limiar da sobrevivência, em regime supra-precário, bem poderia dizer-se. É disto que trata “18 Months”, uma criação do Quarteto Contratempus que em regime de coprodução com a Casa das Artes de Vila Nova de Famalicão (21 e 22 de fevereiro, sexta e sábado) e o Centro Cultural de Belém (récita marcada para o dia 10 de abril) tornará o espetáculo num ‘bem (do) público’.
Da expressão temporal “18 Months” pode retirar-se talvez uma outra aceção, a de um somatório metafórico que pode assumir um significado mais amplo: o tempo de Renascer… para os protagonistas deste infortúnio, os refugiados. De resto a esperança é também uma das coordenadas no GPS desta narrativa.
Por conseguinte, enfatizando a súmula de conteúdo do espetáculo, enquanto chave para uma maior compreensão: “A ópera explora a luta desesperada dos refugiados no mar, as intervenções divinas que questionam a natureza do sofrimento e o desafio que é encontrar aceitação numa nova terra. À medida que os refugiados enfrentam os seus traumas do passado e lutam por um futuro de esperança, 18 Months examina a resiliência do espírito humano e a interação complexa entre a esperança, a empatia e as duras realidades conferidas por estarem fora do seu país de origem.”
Em conformidade com a exploração desta abordagem para o trabalho sobre esta ópera de câmara multimédia no domínio da encenação está a visão de Nuno M Cardoso, que advoga para o efeito: “Há um conceito de linha de fronteira, essas linhas que se transformam em feridas, cicatrizes, fissuras e portanto são linhas de separação trauma-rutura.” E prossegue o raciocínio: “São linhas imaginárias, fictícias, construídas e a proposta de encenação põe em causa realmente a razão da existência dessas linhas-fronteira, provocando a reflexão sobre a alteridade, diferença, proximidade ou semalhança”, defende o responsável pela movimentação das peças no tabuleiro de cena, vulgo intérpretes. Ele para quem a raiz e origem do respetivo trabalho no teatro e nas artes performativas também começou na música.
E se a conceção de 18 Months é um labor tributário de múltiplas contribuições, importa também salientar que o libreto é da autoria do professor sírio radicado nos EUA, Fadi Skeiker, cuja recolha de histórias da vida real deu origem ao fio condutor desta narrativa operática. O libretista recolheu depoimentos de refugiados afegãos, sírios e ucranianos que vivem em Portugal.
No capítulo das contribuições internacionais, importa ainda referir que a composição original criada especificamente para esta ópera ficou a cargo do músico grego radicado em Portugal, Dimitris Andrikopoulos. Como singela curiosidade, acrescente-se a colaboração ao nível dos figurinos e cenografia por parte de Nuno Carinhas, ex-diretor artístico do Teatro Nacional São João.
O Quarteto Contratempus tem norteado a sua ação artística com um cunho de preocupação social, a título de exemplo, e não há muito tempo, a ópera “Lugar Comum” apresentada um pouco por todo o país espelhava com veemência a questão da violência doméstica, um tópico também ele perene de atualidade. Daí que a aposta numa temática que marca o tempo presente, como a questão dos refugiados, faça todo o sentido na agenda desta estrutura sediada no Porto.