Ter um acidente cardiovascular e ser obrigado a recomeçar uma vida, enfrentando tudo aquilo que a doença cardiovascular traz associado: a gestão das emoções, a imprevisibilidade da doença, as incapacidades que ela provoca ou pode provocar, a dependência parcial ou total de terceiros, o reaprender coisas básicas como falar, andar, mexer, as limitações dos cuidadores e a falta de preparação de muitos deles, os dramas económicos e sociais que, em muitos casos, andam de mãos dadas com a doença cardiovascular…
Foi este o ponto de partida para a mesa redonda sobre “A doença Cardiovascular: Riscos e Prevenção”, integrada na cerimónia de abertura do XIV Ciclo de Conferências e a Jornadas Científicas dos diferentes departamentos que integram o Instituto Superior de Ciências da Saúde – Norte/CESPU e que decorre na sala do Arquivo do Centro de Congressos da Alfândega do Porto, hoje e amanhã.
Mais uma vez, a comunidade académica está reunida para discutir temas da actualidade, com a participação de especialistas convidados, numa actividade de enriquecimento académico e científico, face à pertinência dos assuntos escolhidos para os diferentes eventos científicos.
Atendendo ao tema escolhido pela organização para o debate – “A Doença Cardiovascular: Riscos e Prevenção” -, estão presentes no evento individualidades consideradas “relevantes para a discussão da temática, como é o caso de cardiologistas, especialistas ligados ao exercício físico e nutricionistas, representativos de áreas fundamentais para a prevenção e diminuição de risco cardiovascular”, refere Jorge Brandão Proença, reitor do Instituto Universitário de Ciências da Saúde.
No arranque da discussão, a jornalista da RTP Fátima Araújo, a quem coube moderar a mesa redonda sobre “A Doença Cardiovascular: Riscos e Prevenção”, procurou obter “um olhar multidisciplinar sobre uma realidade que é um problema de saúde pública nacional e mundial”. Fátima Araújo começou por sublinhar que “as doenças cardiovasculares são a primeira causa de morte nos países desenvolvidos, matam 17 milhões de pessoas, por ano, em todo o mundo, e 35 mil em Portugal, implicam gastos do orçamento da saúde, mexem com o dinheiro de todos nós, contribuintes, afectam a produtividade ou falta dela dos trabalhadores que se vêm confrontados com a doença e dos familiares que faltam ao trabalho para serem cuidadores”.
A jornalista desafiou, por isso, os palestrantes a questionarem “o que estará a falhar e o que continua a faltar, para pormos a prevenção e a intervenção preventiva no topo das nossas prioridades”. Perguntou a jornalista “se existem em Portugal campanhas de informação, se existem programas de esclarecimento e de divulgação científica nos meios de comunicação social, se temos excelentes profissionais de diferentes áreas a prevenir e a tratar a doença cardiovascular, desde médicos de diferentes especialidades, a enfermeiros, fisiatras, fisioterapeutas, psicólogos, psiquiatras e nutricionistas”, por que razão “continuamos a ter uma tão elevada prevalênia da doença cardiovascular na sociedade portuguesa?”
Sendo estas Conferências e Jornadas Científicas um palco de reflexão, de partilha de experiências e de agitar de consciências, Fátima Araújo defendeu que “a acção tem de ser dinamizada, porque não nos podemos contentar ou resignar com respostas do género falta dinheiro, faltam recursos ou falta vontade política”.
O Professor da Faculdade de Medicina da Universidade do Porto e Director do Serviço de Cardiologia Pediátrica do Hospital de São João, no Porto, José Carlos Areias, fez uma exposição baseada na possibilidade de “a doença cardiovascular começar a ser prevenida” ou acautelada aquando da “gestação e do início da vida fetal”.
Também o Nutricionista do Hospital de Santa Maria, em Lisboa, especialista em doenças metabólicas e comportamento alimentar e Coadjuvante do Director do Programa Nacional para a Promoção da Alimentação Saudável, da Direcção Geral de Saúde, José Camolas, fez a apologia de que a prevenção de doenças como as cardiovasculares, a diabetes ou o cancro “começa na barriga da mãe ou até antes disso” e enfatizou a necessidade de pais e educadores fazerem “a pedagogia dos hábitos alimentares saudáveis”.
A Vice-Bastonária da Ordem dos Nutricionistas e Responsável pelo Serviço de Nutrição e Dietética do Hospital do Espírito Santo, em Évora, Graça Raimundo, enfatizou a importância duma alimentação pobre em sal e açúcar e reconheceu a “insuficiência de nutricionaistas” no Serviço Nacional de Saúde, admitindo que, se se aumentar o actual rácio de cerca de cem nutricionaistas a trabalhar nos cerca de quatrocentos centros de saúde portugueses, pode-se “ajudar a reduzir ainda mais os riscos da doença cardiovascular”.
O cardiologista João Morais, que é Presidente da Sociedade Portuguesa de Cardiologia e Director do Serviço de Cardiologia do Centro Hospitalar de Leiria, reafirmou a necessidade de alocar meios ao diagnóstico precoce e de “a insuficiência cardíaca ser considerada uma prioridade no Programa Nacional das Doenças Cérebro-Cardiovasculares”.
No raio-x que fez ao actual estado de coisas, Domingos Gomes, um dos mais carismáticos médicos portugueses, especialista em Medicina Desportiva, insistiu na ideia de “facilitar o acesso a exames de aptidão desportiva” em meio escolar e nas unidades de saúde nacionais, como medida preventiva, e de um “acompanhamento contínuo e especializado dessa prática desportiva”.
As Jornadas Científicas dos diversos departamentos do IUCS, nomeadamente de Ciências Dentárias, Ciências Farmacêuticas, Ciências da Nutrição, Ciências Biomédicas, Ciências Laboratoriais Forenses e Psicologia, decorrem até esta sexta-feira, 25 de Maio.