Entrevistas

Guarda redes Beto: “Sou muito competitivo, mas sou um coração mole”

Guarda-redes abre o coração em exclusivo à Agencia de Informação Norte

Beto, o Guarda-redes com um palmarés invejável. Leixões e FC Porto foram, dois, dos clubes que representou a norte. Contudo, foi no estrangeiro que o profissional, de 38 anos, continuou a escrever parte da sua história. Quis a vida que, Beto, regressasse a Portugal.  Hoje defende a baliza do Farense, com o profissionalismo a que já nos habituou. Conheça, agora, o desafio da Agência de Informação Norte a Beto.. Dez perguntas que ajudam a desvendar os segredos de uma posição “ingrata” no futebol.  

Por: Andreia Gonçalves
Foto: DR

Agência de Informação Norte – Ser Guarda redes é uma escolha, de criança, ou uma posição que o “ganhou” nas escolinhas de futebol?
Beto – Há jovens que sonham ser Guarda-redes, porque têm ídolos, nesta posição. Outros vão percebendo que têm aptidão para estarem à baliza. No meu caso, aos sete anos, fui para extremo, mas como era pequeno, “fortezinho” e tinha alguma técnica, o treinador disse-me para tentar na baliza.  A verdade é que, logo, no primeiro treino senti que era ali que eu queria estar. Eu sou daqueles que se foi apaixonando pela defesa das redes.

Beto, como se escolhem as luvas?
 Hoje em dia, é mais fácil, escolher um modelo mais cómodo (sorrisos). As primeiras que tive estavam todas rotas, mas a paixão era tão grande, que não importava a marca ou as condições em que se encontravam. Como profissional a luva é um artigo muito pessoal. Existem Guarda-redes que gostam de mostrar que têm mãos grandes. Não é o meu caso.  Eu prefiro luvas com boa aderência para trabalhar com mais confiança. E prefiro luvas mais pequenas, bem agarradas às minhas mãos, para segurar a bola com mais convicção e segurança.

Os Guarda-redes “cospem” nas luvas. Porquê? (Preciso que nos convença)
Só quando não está a chover (risos). Eu até faço pior, eu lambo as luvas. (risos). O objetivo é humedecer, o couro ou latex para uma melhor aderência. Por isso, sentimos essa necessidade. Até deitamos água para as luvas, mas como não temos a garrafa sempre à mão, fazemos isso…

A dificuldade de ser Guarda-redes é imensa

Quem está na baliza pensa naquilo que pode estar na cabeça do avançado, que vem na sua direção com a bola?
Não pensamos no que vai na cabeça do avançado. Nós guiamo-nos pela posição, pela forma como nos olha, e depende do estudo que façamos dos jogadores, na fase da preparação do encontro.  Penso onde me posicionar para aquilo que o jogador, tendencialmente, pode fazer. Temos muitas decisões para tomar, na hora, e seguimo-nos pelos instintos.

Os Guarda-redes são, quase, sempre os heróis ou os culpados na derrota. Como se lida com estas emoções?
Foi um processo que aperfeiçoei, com a experiência no futebol profissional.  Tive de aprender a lidar com o sucesso e com as derrotas.  E, claro, é mais fácil lidar com os momentos de glória.
O Guarda-redes está mais sinalizado numa derrota. Por isso os holofotes vão todos na nossa direção. É mais fácil culpar uma pessoa do que avaliar uma jogada na totalidade. Os Guarda-redes até estão vestidos de forma diferente (risos).
Se o avançado falhar, dez possibilidades e marcar um golo, sai do jogo como herói. Mas, connosco é uma situação mais ingrata. Contudo, o Guarda-redes é o mais importante em campo. Somos os jogadores mais completos, pensamos o jogo, temos de tomar muitas decisões e de uma forma constante, durante os 90 minutos.  Eu costumo dizer que é mais fácil, eu jogar a ponta de lança, do que um vir um para o meu lugar. A dificuldade de ser Guarda-redes é imensa. É uma posição de muito risco.

No final, de um encontro, vai para casa e faz a leitura, mental, das jogadas e das emoções do jogo?
Já fiz mais, confesso. Há alguns anos, vivia muito mais o momento de glória. Mas, com a experiência aprendi a desfrutar desses momentos e acabo por me preocupar, mais, com as emoções do que os meus jogos provocam aos que me dizem muito (família e amigos) e aos adeptos. Contribuir para a vitória do meu clube, para o sorriso da minha mãe e dos meus filhos e amigos é para mim o mais importante. A maturidade traz isso. Para mim há, sempre, mais para fazer no dia seguinte. Novo treino, novo jogo, estou sempre à prova.

Emocionalmente, há diferenças entre vestir a camisola de um clube e a da seleção nacional de futebol? Cada emblema que represento faço-o com compromisso dedicação. Não vou mentir que vestir a camisola da seleção é, realmente, o expoente máximo do futebol português. É um orgulho e uma realização pessoal, não há nada acima disso.

Eu amo o norte e as suas gentes

Viver num patamar mediático não lhe retirou valores como a humildade. Como se gera tudo isto?
Sou muito competitivo, mas sou um coração mole. No entanto, os meus amigos são os mesmos de antigamente.
Fiz novos amigos, mas não esqueço os de antes. É assim que eu estou, e gosto de estar, na vida. Chegas a um patamar mediático que te obriga a criar alguma proteção à tua volta. Mas, felizmente nunca me preocupei muito com isso.  Pois, cresci com pouco,  cheguei onde estou, mas não me esqueci de onde vim.
Para mim é importante manter ao meu lado os que gostam de mim, pelo que sou, pela minha essência. E reconheço, facilmente, quem quer ser meu amigo, apenas, pelo que represento.
Fui criado com valores que mantenho, os meus pais foram exímios na minha educação.
Não sou superior a ninguém pelo materialismo, por isso considero ter, na sociedade, um lugar mais saudável.
Eu tenho a real noção que isto é passageiro e preciso regar as amizades e ter os meus verdadeiros amigos, sempre, por perto.  Por isso, também, não me deixo abrilhantar pelas redes sociais. As mensagens são filtradas. Temos de nos adaptar a tudo isto. Mas, para mim não é mais importante o número de seguidores do que trabalho que faço, em campo. Conseguir este equilíbrio é o ideal.

Há, certamente, uma pessoa que gostaria que estivesse, aqui, para ver todo este percurso. É nele que pensa cada vez que olha para o céu, com as luvas nas mãos?
O meu pai, sem dúvida. Foi a minha maior perda. Irreparável. Partiu no dia em que assinei pelo Leixões. Altura em que eu ia relançar a minha carreira. Tive, sempre, o apoio dele nos momentos mais difíceis. E, na altura pensei, agora, que conquistei tudo isto, tu não estás aqui!
Muitas das decisões que tive de tomar na vida, foi a pensar nele.
Quis provar-lhe que eu era capaz. Tive de aprender a estar sem ele, e a desenrascar-me. Mas, tive sempre a minha mãe do meu lado. O meu herói foi, sempre,  ele. Construi uma carreira bonita e dedico-lhe por inteiro.  Por isso acredito que, hoje, se ele cá estivesse diria que tem muito orgulho no meu percurso.

Foi no Norte que construiu parte da sua história. Há algum sentimento especial pelo norte?
Gosto da energia que sinto no norte. Eu amo o norte e as suas gentes. Tenho muitos amigos lá, seja em Bragança, Viseu ou Matosinhos. O norte abraçou-me… Quando algo tão bonito te abraça, é lá que tens de ficar. Grande parte do meu coração é do norte. Assim como as minhas raízes.

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